Ribeirão volta às páginas policiais
Na última campanha eleitoral de prefeito, uma das promessas mais ouvidas do então candidato Duarte Nogueira, que é hoje inquilino do Palácio Rio Branco, era que ele tiraria nossa querida Ribeirão Preto das páginas policiais. Mas no último dia 11/05, segunda-feira antes do sol raiar, a Polícia Federal estava cumprindo mandato de busca e apreensão de documentos, computadores e celulares na Secretaria Municipal da Administração, no Morro de São Bento, e em outros locais.
A farra das ambulâncias
A mídia está denominando este caso de “a farra das ambulâncias”. Já estamos em repercussão nacional. De novo. Triste. Os desdobramentos devem estar tirando o sono e o sonho de reeleição do prefeito.
O pior agravante é que jazem na prefeitura 13 ambulâncias novinhas, sem uso desde o ano passado, ainda sem emplacamento e documentação, totalmente preparadas para atender à demanda! É simplesmente indefensável o contrato ao custo de R$ 1.103.419,27 com dispensa de licitação para alugar quatro ambulâncias por quatro meses para fazer frente ao crescimento da demanda de pacientes devido à pandemia. A denúncia é investigada nas três esferas: uma CPI na Câmara Municipal, o Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal que mandou a PF investigar – tudo indica que a primeira colheita foi robusta.
O oportunismo dos amigos de rei
Antes até da improbidade, é sobretudo desumano verificarmos como os amigos do rei tentam tirar proveito da situação de calamidade pública e emergência sanitária em que vive o país. Investigações do mau uso do dinheiro público estão sendo realizadas em 11 estados e no Distrito Federal. As operações começaram depois que o Ministério Público e a polícia descobriram indícios de irregularidades nas compras de insumos para o combate à pandemia de Covid-19, segundo informações divulgadas pela imprensa (ma mudança na legislação passou a permitir, desde fevereiro, que as compras sejam feitas sem licitação).
Detalhes do caso são estarrecedores
A empresa que alugou as ambulâncias para a prefeitura é a SOS Médicos, de propriedade de um amigo do peito do prefeito, que foi até seu cabo eleitoral em 2016. Uma negociata de compadrio.
O secretário da saúde já foi consultor dessa empresa e sua esposa já foi sócia do atual proprietário. Tudo em “famiglia“. E o secretário da saúde não vê nenhum problema nisso…
A Procuradoria do Município deu parecer contrário à negociata, que não foi levado em conta. O discurso de moralidade do prefeito já foi para o espaço.
E tem mais: segundo depoimento de um dos fornecedores à PF, preterido com orçamento de R$ 563 mil (metade do valor contratado), houve trocas de e-mails e mensagens de aplicativo WhatsApp com instruções e mensagens de voz de uma servidora pública para alinhar os orçamentos acima de R$ 1 milhão, em dia de domingo, e envio desses orçamentos para e-mail pessoal da referida servidora. Que lambança!
A SOS Médicos não tem em seu cadastro no CNAE – Código Nacional de Atividades Econômicas – a atividade de locação de ambulâncias. Também por isso, a contratação é irregular.
Poderia ter sido diferente
Escrevi este texto no dia 13/05 e até então, depois de todo este affair, o prefeito ainda mantém o contrato e persiste no erro. Já teve oportunidade de recuar e não o fez. Pelo contrário, já defendeu com veemência, durante entrevista coletiva, a contratação da referida empresa para locação de ambulâncias. Isso comprova sua inabilidade para gerir a coisa pública em nossa cidade.
Sua última eleição acabou definida pelas notinhas de dois reais, lembra? Mas o GAECO e a PF não voltaram ao assunto depois da eleição. Agora, sabe lá Deus porque, o feitiço virou contra o feiticeiro e não são mais 2 reais, são R$ 1.103.419,27!
A ponta do iceberg?
De qualquer forma, talvez a Operação Sevandija não tenha deixado lições para os tucanos. Ela também começou com investigações preliminares, o que levou a ex-prefeita a dizer que “não ia dar em nada”. Deu em cadeia para muita gente, inclusive para ela. Há quem diga que a farra das ambulâncias seja apenas a ponta do iceberg. Pode ser.
A propalada moralidade das campanhas eleitorais tucanas também foi para o espaço. Duarte Nogueira terá de “correr” atrás de mais essa. As primeiras reações oficiais foram decepcionantes. Não se explica nada e é só o blá-blá-blá de que tudo isso é intriga da oposição, perseguição dos desafetos, etc.
Os desdobramentos prometem. Acompanhemos.
(Texto originalmente publicado em 16/05/2020 no jornal Tribuna de Ribeirão Preto, SP)
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