O estúpido pastor Silas Malafaia resolveu arregaçar as mangas e ir para cima dos ministros do Genocida, reclamando de um boicote palaciano ao “terrivelmente evangélico” no STF. Antes de tudo, é uma guerra intestina entre o Centrão e a Base Evangélica para saber quem é mais terrível na indicação do próximo ministro. Como lembrou Reinaldo Azevedo, na CartaCapital, o “terrivelmente evangélico”, assim como o “terrivelmente budista” ou “terrivelmente católico”, seria apenas um sectário e intolerante, inapto para o Supremo. O que se espera de um juiz do STF é que tenha notável saber jurídico e reputação ilibada, como diz a Constituição, no seu artigo 101. Só isso. Antes de mais nada, faz bem Alcolumbre barrar o “terrivelmente evangélico”.
Apenas um projeto de poder
Malafaia dá uma de cão de guarda do bolsonarismo entre os evangélicos. O cara está furioso com as enormes resistências enfrentadas por André Mendonça para conseguir a indicação, como “terrivelmente evangélico”, acordo de Bolsonaro com a sua base religiosa. Sem dúvida, a arrogância desse pastor comprova a denúncia que estou fazendo aqui nessa coluna há meses: está em curso um atentado a um dos pilares da democracia que é justamente o Estado laico, o Estado independente de qualquer grupo religioso. Afinal, qual a diferença dessa gente com o Islã radical? Para mim, nenhuma!
Mas, da mesma forma, eu perguntaria para a vereadora que pretende dar o título de cidadania ribeirão-pretana a Damares Alves: o que torna alguém um “terrivelmente” evangélico”? Ou não torna? Está aí um belo debate filosófico, se não for um debate teológico. Nós sabemos que não é nada disso. É apenas um projeto de poder muito claro, do qual a vereadora é parte integrante. Sobretudo porque o senhor Mendonça já disse a que veio quando foi ministro do Genocida. Confundiu crime com liberdade de expressão e liberdade de expressão com crime. Ele nunca foi “terrivelmente evangélico”. Foi apenas terrivelmente autoritário, obscurantista, reacionário e fascista. Simples assim.
Indicação totalmente inconstitucional
Mendonça já declarou que está sob a autoridade de pastores. Só por isso sua indicação já viola a laicidade do Estado, prevista na Constituição em vários dos seus artigos. É totalmente inconstitucional. Concordo com Joaquim de Carvalho, colunista do 247, quando escreveu que a resistência de Alcolumbre, presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, em pautar a indicação de Mendonça, chega a ser um ato civilizatório. Chegamos a um estágio da civilização em que não se admite mais tamanha ignorância. Em outras palavras, não é por ser de direita, de centro ou de esquerda, é por ser contra o avanço da humanidade.
Ser “terrivelmente evangélico” é critério jurídico? Porque, pelo que tudo indica, é em torno dessa questão que se dá o verdadeiro round pela indicação de Mendonça. E retorno a Reinaldo Azevedo: “Que esse absurdo tenha sido dito e, de algum modo, assimilado, indica o rebaixamento a que estamos expostos. E notem: quer-se esse evangélico sectário para integrar a mais alta corte do país. Os indivíduos que lá chegam podem ter lado, religião, ideologia. Quando põem a toga, viram ministros. E as paixões têm de ficar do lado de fora da Corte.” A nossa vereadora certamente não concorda.
O objetivo é a tomada do Estado
A simbiose do Império Romano com o Cristianismo, a partir de Constantino (Edito de Milão em 313) é que deu origem a essas igrejas vocacionadas para o controle do Estado, com base em um pretenso universalismo cristão. Isso nada tem a ver com o Evangelho de Jesus de Nazaré. Em seguida, a luta das investiduras entre reis e papas iniciou uma disputa que desembocou no Iluminismo e nas revoluções burguesas, com a defenestração das igrejas do poder político. De lá pra cá, as viúvas do reino dos homens continuam sonhando com a volta da cristandade e da teocracia medieval. São, afinal, os arautos da restauração do poder político da Igreja (agora, igrejas) sobre toda a sociedade. Deus nos livre!
Em nosso último artigo, falamos do aparelhamento do Ministério de Damares com nomeações a rodo de pessoas ligadas a grupos religiosos conservadores. Mas esse fato está ocorrendo em todo o governo do Genocida. Assim, a conclusão é lógica: existe claramente um projeto de poder instalado no governo federal Trata-se da tomada do Estado com objetivos muito claros. Um projeto político que tira a sua, a minha, a nossa liberdade de escolha para nos submeter a uma visão única de mundo, a valores e a princípios de caras como Mendonça, Malafaia, Damares, Waldomiro e Macedo, para ficar nos mais conhecidos – e com todo apoio da vereadora de Ribeirão Preto. Faz bem Alcolumbre barrar o “terrivelmente evangélico”. Portanto, continuemos na resistência!
O jornal Tribuna publicou originalmente este artigo na sua edição do dia 16 de outubro de 2021
Leia também Religião é irrelevante para a atividade de juiz e Damares: abstinência sexual como política pública
Se você quiser me conhecer melhor, clique em https://www.professorlages.com.br/perfil