Em boa hora, a Igreja Católica e outras igrejas cristãs escolheram, mais uma vez, a temática da fome para a Campanha da Fraternidade deste ano. A princípio, a Campanha da Fraternidade é um chamado à reflexão sobre os problemas que angustiam a humanidade e, em particular, os brasileiros. Problemas que os afastam da boa nova do Evangelho de Jesus de Nazaré. A escolha da temática deste ano, realizada através de consulta pública, foi feita depois que o Brasil voltou a aparecer no Mapa da Fome. Assim, o número de brasileiros que não têm o que comer passou de 19,1 milhões em 2020 para 33,1 milhões em 2022.
Segundo a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), um dos objetivos da campanha é “propor aos fiéis um caminho de conversão para não ceder à cultura da indiferença frente ao sofrimento humano”. No lançamento da campanha, o secretário-geral da CNBB, Dom Joel Portella Amado, defendeu o direito à alimentação saudável e pregou contra o desperdício. “Se a fome de uma única pessoa já nos deve incomodar, como nos tornarmos indiferentes diante da fome de inúmeros irmãos e irmãs?”, perguntou. Além disso, ele disse também que “segurança alimentar e democracia andam juntas”.
Intolerância e articulação bolsonarista
Na contramão de todo o espírito cristão da campanha, tão enfatizado pelo próprio Papa Francisco, “cristãos” extremistas veem na ação da CNBB, uma espécie de conspiração comunista e convocam outros fiéis a não aderirem ao pedido de doações para a campanha. Sabemos que vem de longe esta reação ultraconservadora às campanhas da fraternidade e à própria CNBB, como já escrevi por aqui em 2021, por exemplo, mas, neste ano, assume contornos particulares tendo em vista a conjuntura política do início do terceiro governo Lula e da derrota eleitoral de Bolsonaro, fazendo com que os ataques sejam mais virulentos.
Influenciadores digitais ligados ao bolsonarismo lideram a mobilização contra a campanha deste ano. Bem como uma entidade ultraconservadora que ficou famosa ao tentar censurar na Justiça um especial de Natal do grupo humorístico Porta dos Fundos em 2020. Para quem já esqueceu, atacaram a sede desse grupo com coquetéis molotov, na véspera do natal de 2019. Um dos terroristas fugiu para a Rússia, onde foi preso pela Interpol, e acabou deportado de volta ao Brasil. Então, percebe-se que este movimento se articula com outros grupos, todos atualmente ligados ao bolsonarismo.
Negacionismo da fome
O youtuber bolsonarista Bernardo Pires Kuster, que é investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito das fake news, está fazendo uma série de vídeos contra a CNBB e a Campanha da Fraternidade deste ano. Além de atingirem milhares de pessoas diretamente através de seus vídeos, as pregações de Küster ganham repercussão em compartilhamentos em redes sociais como Twitter e Facebook e são replicadas em grupos de aplicativos de mensagens, como WhatsApp e Telegram. Ele grava seus vídeos em um cenário que tem ao fundo um quadro do guru da extrema-direita Olavo de Carvalho, falecido no ano passado.
Assim como Kuster, outros influencers extremistas vêm questionando o levantamento da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) que apontou a existência de 33 milhões de brasileiros em insegurança alimentar. Mas, na verdade, o Brasil voltou a aparecer no Mapa da Fome. Eles atacam também a Campanha da Fraternidade pela menção, nos textos de apresentação e apoio à ação, aos atos de distribuição de comida aos mais necessitados pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) ao longo da pandemia. Da mesma forma, debocham de uma frase do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, que dizia que “quem tem fome, tem pressa” e precisa ser ajudado imediatamente.
“O antiCristo presidiu o Brasil e nem todos perceberam”
A intolerância desses grupos bolsonaristas merece o repúdio de toda a sociedade civilizada. Hoje, é claramente visível uma parcela da sociedade, contaminada pelo discurso do ódio e da mentira, que tenta lançar seus tentáculos sobre os nacos do poder para impor a sua ideologia sobre quem pensa diferente. Perderam a eleição do ano passado, mas seguem ativos, apostando no confronto e na polarização. E da sua guerra cultural não escapa nem mesmo a Campanha da Fraternidade. Bem afirmou Hildegard Angel: “o antiCristo presidiu o Brasil e nem todos perceberam!”
O jornal TRIBUNA tambémpublicou este artigo na sua edição de 04/03/2023
Acesse nosso artigo sobre o boicote bolsonarista à Campanha da Fraternidade em 2021:
https://www.professorlages.com.br/a-campanha-deste-ano-condena-a-violencia-contra-as-minorias/
Saiba mais e apoie a Campanha da Fraternidade 2023:
https://campanhas.cnbb.org.br/campanha/campanha-da-fraternidade-2023
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