No Brasil, o controle da sociedade sobre as políticas públicas foi consagrado na Constituição de 1988, através de diversos instrumentos de participação social. O conjunto desses instrumentos resultou no que se convencionou chamar de democracia participativa, fruto de uma longa história que vinha desde as lutas pela redemocratização. Com os novos canais de participação popular, surgidos na década de 90, os movimentos sociais ocuparam um espaço nunca visto antes. Esses movimentos alcançaram uma postura mais propositiva, passando entender o Estado como instrumento em disputa. Cidadania e participação popular andam sempre juntas.
Legitimação popular e Democracia participativa
Assim, os movimentos sociais passaram a conquistar espaços no interior do próprio Estado, alargando o leque de interlocutores e ampliando sua legitimidade. A legitimação popular, sem dúvida, decorre lógica e diretamente da forma de governo (República) e do tipo de Estado (Democrático de Direito), além, é claro, da titularidade do poder que lhe foi conferida. Mas não só disso. A cidadania passa a ser o grande fator de legitimação do povo, permitindo que ele atue em defesa das instituições democráticas.
Mas como podemos conceituar democracia participativa? A democracia participativa é a que se utiliza de diversos mecanismos que proporcionam à população um engajamento nas questões políticas, legitimando pautas de relevância para a comunidade, através de uma participação direta, seja pelo plebiscito, referendo, iniciativa popular, audiência pública, orçamento participativo, consultas ou por qualquer outra forma que manifeste a ação e a vontade populares.
Participação popular e políticas públicas
Um ponto importante desse processo refere-se à descentralização das políticas públicas, advinda do federalismo fiscal. Assim, a provisão local descentralizada dos serviços públicos torna-se mais eficiente para aumentar o bem-estar da população. Este argumento econômico, que visa o aumento da eficiência na alocação dos recursos públicos, ganhou força dentro de um contexto de profunda crise do modelo de Estado do Bem-Estar Social. É no governo local que a participação popular se torna mais concreta, no sentido de aproximar a participação ativa dos cidadãos dos resultados dela decorrentes. Cidadania e participação popular andam sempre juntas.
Neste contexto disseminaram-se pelo país afora os conselhos de políticas públicas e de defesa de direitos. Eles articulam representantes da população e membros do poder público municipal em práticas que dizem respeito à gestão de bens públicos. Surgiram nas décadas de 70 e 80, quando foram criados para negociar demandas dos movimentos populares, muitas vezes não institucionalizados, mas bastante autônomos e reivindicativos. Ao viabilizarem a participação dos diferentes segmentos sociais na formulação das políticas públicas, os conselhos possibilitam à população o acesso aos espaços onde se tomam as decisões. Além disso, eles ofereceram condições para um sistema de vigilância sobre a gestão pública, implicando em maior cobrança de prestação de contas do Executivo.
Conselhos municipais e garantia de direitos
Os conselhos municipais geralmente possuem composição paritária entre representantes da sociedade civil e da administração pública, são criados por lei, regidos por regulamento aprovado por seu plenário, tendo caráter obrigatório, uma vez que os repasses de recursos ficam, muitas vezes, condicionados à sua existência. Eles assumem atribuições consultivas, deliberativas e/ou de controle. Seu formato varia conforme estejam vinculados à implementação de ações focalizadas, através de conselhos gestores de programas governamentais.
Como exemplos desses programas, podemos citar os recursos do FUNDEB, da merenda ou da alimentação escolar, financiamento de programas de saúde e vários outros. Para a elaboração, implantação e controle de uma série de políticas públicas, existem muitos conselhos definidos por leis federais para concretizarem direitos de caráter universal nas áreas de saúde, educação, cultura, etc. Há também conselhos envolvidos com temas transversais que permeiam os direitos dos indivíduos na sociedade, como os conselhos da criança e adolescente, juventude, idoso, mulher, direitos LGBTQIA+, e vários outros. Percebe-se, então, porque os prefeitos fazem de tudo para ter o controle desses conselhos, como acontece aqui em Ribeirão Preto. Ainda voltaremos ao assunto.
Este artigo foi também publicado pelo jornal TRIBUNA na sua edição do dia 06/08/2022.
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