Estamos ainda assistindo ao lengalenga dos antivacinas, agora com foco em muitas mentiras em relação à sua aplicação nas crianças. Mentiras que são alimentadas pelo pior presidente da nossa história. Li dois artigos muito elucidativos de Camilo Aggio, articulista da CartaCapital, sobre as mais recentes fake news. Ele é PhD em Comunicação e Cultura Contemporâneas, professor e pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais, membro do Grupos de Pesquisa em Democracia e Justiça (Margem). É também pesquisador associado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital. Vou tecer alguns comentários sobre o assunto e sobre o artigo. São gritantes as mentiras do movimento antivacina.
O diabo mora nos detalhes
Aggio analisa uma relação surpreendente entre o grau de escolaridade dos pais e mães de família e a pretensão ou não de vacinar seus filhos e filhas. Primeiramente, ele parte de uma pesquisa realizada pelo Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), do Governo do Estado de São Paulo, e publicada no último dia 7. De acordo com a pesquisa, 84% dos responsáveis por crianças no estado de São Paulo afirmam que pretendem vacinar suas filhas e filhos contra a Covid-19. No entanto, como diz o velho provérbio, o diabo mora nos detalhes. Quando discriminado por escolaridade, esse número sobe para 92% entre os que têm até o ensino fundamental, mas cai para 77% entre os que possuem ensino superior.
O Brasil é o segundo país do mundo com o maior número de crianças mortas em decorrência da Covid-19, segundo levantamento do jornal Estado de S. Paulo e da Fiocruz. Assim, já morreram 1.449 crianças de até 11 anos. Apesar desses números trágicos, somos obrigados a admitir que a maior escolaridade das famílias não tem ajudado nessa guerra. Em outras palavras, o nível de escolarização é inversamente proporcional à intenção de pais e mães em vacinarem suas crianças. Acredito que, para muitos, esta constatação pode até soar inverossímil, mas em tempos de bolsonarismo, constatações são, de fato, decepcionantes…
Onde erramos?
Aggio afirma que “os números do levantamento se somam a outras tantas evidências anedóticas e científicas. Curiosamente, essas ainda conduzem a diagnósticos e prescrições equivocadas sobre determinados comportamentos sociais e políticos.” Assino embaixo. Nesse sentido, infelizmente, não é verdade que quanto maior o nível de escolaridade, maior será a tendência de que os indivíduos adotem comportamentos mais bem orientados pela racionalidade e pela ciência. Nós, educadores, muitas vezes caímos em fantasias sociais quando saímos gritando por aí que a escola é a chave para se resolver todos os problemas da humanidade. Antes de tudo, como seria bom se isso fosse verdade!
Dessa forma, ficamos até com certo remorso quando observamos, com pesar, alguns ex-alunos e ex-alunas nossos, hoje adultos, se enveredarem por caminhos e ideias absurdas nessa conjuntura social e política trágica. Então, onde erramos? Somos impelidos a fazer essa pergunta muitas vezes. Afinal, chego à conclusão de que, se erramos, foi por acreditar exatamente que a educação escolar resolveria todos os nossos problemas. Acreditamos que ela conduziria os indivíduos a um voto mais racional, por exemplo, ou os prepararia para se defender das mentiras. Hoje como ontem, não é somente nosso trabalho como educadores que forma corações e mentes.
Fake news reforçam convicções
Temos a tendência de refutar informações que se jogam contra nossas convicções e a abraçar aquelas que as reforçam. E por “informações”, incluímos aqui as falsas e objetivamente incorretas. Os que aderem às fake news não aderem a qualquer uma, mas selecionam aquelas que lhe são úteis, que não causam desconforto e que mantém suas convicções em paz. As fake news dizem respeito a problemas concretos e a questões de interesse público, político e eleitoral. Como afirma Aggio, “as fake news que ganham relevância pública só o fazem porque refletem algo sobre coisas ou estados de coisas presentes em percepções e preocupações de natureza coletiva”. São gritantes as mentiras do movimento antivacina. Tenhamos isso sempre em mente.
Este é um tema vasto e até instigante. Pretendo retornar a ele no próximo artigo.
O jornal TRIBUNA publicou originalmente este artigo na sua edição do dia 24 de janeiro de 2022.
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