Que Jesus de Nazaré foi um personagem histórico não há nenhuma dúvida. Pode parecer uma grande evidência, mas digo isso porque, no passado e ainda hoje, existem cientistas renomados que colocam em dúvida a sua existência real. A Arqueologia, como uma grande ciência auxiliar da História, ainda não nos oferceu uma prova cabal e definitiva da existência do Nazareno, mas este não é o único critério utilizado pela História. A literatura extrabíblica da época de Jesus nos oferce várias referências, com destaque para o escritor judeu Flávio Josefo. Por outro lado, seria impossível alguém não ocupar a centralidade histórica de um movimento tão vigoroso como o cristianismo. E este alguém só pode ser Jesus. Podemos concluir que Jesus de Nazaré foi um personagem histórico.
O Jesus histórico e o Jesus da fé
A própria teologia cristã diferencia o Jesus histórico do Jesus da fé, “o Jesus” de “o Cristo”, se bem que ambos se implicam, às vezes, de forma inseparável. Os quatro evangelhos permeiam a todo tempo o Jesus histórico e o Jesus da fé. O Jesus histórico nos escapa em vários momentos, até porque os dados e informações sobre ele foram redigidos muitos anos depois de sua morte, após uma longa tradição oral. Além disso, os evangelistas nunca foram “historiadores” na concepção moderna do termo. Até mesmo a geografia se ressente dessa diferença: o Jesus histórico, com certeza, nasceu em Nazaré. O Jesus da fé nasceu em Belém de Judá, cidade do rei Davi, para coincidir com antigas profecias dos judeus.
Muito pouco se sabe sobre a infância de Jesus
Resumidamente, Jesus nasceu em uma família judia no tempo do rei Herodes e do imperador Augusto. Sua cidade de origem é mesmo Nazaré, ao norte, na Galileia, região semipagã e, por isso, desprezada pelos israelitas “puros” do sul, centrados em Jerusalém. Ele falava o aramaico galileu e, certamente, conhecia também o antigo hebraico, uma vez que esse idioma era necessário para a leitura da Torah (o Antigo Testamento). Quase nada se sabe sobre a infância do Jesus histórico. Somente os evangelistas Mateus e Lucas se arriscam a poucas informações, mesmo assim, tendendo mais ao Jesus da fé do que ao Jesus histórico.
O trabalho dos arqueólogos tem de se pautar pela Arqueologia como ciência, sem nenhum compromisso de provar o que está nos textos da Bíblia. Destacando mais uma vez que a Bíblia não é um livro de História, mas se utiliza de narrativas históricas com a finalidade de transmitir uma mensagem religiosa. No entanto, temos observado que, recentemente, importantes descobertas arqueológicas têm se aproximado de algumas informações bíblicas, mas ainda sem oferecer provas definitivas. Lembro aqui de uma reportagem da revista Veja de dois anos atrás com o seguinte título, por sinal, bem exagerado: “Arqueólogos afirmam ter encontrado a casa onde Jesus passou a infância”. Vamos ao artigo.
Arqueologia, história e tradição
Em Nazaré, no século IV, foi erguida uma igreja bizantina sobre a antiga estrutura de uma casa de pedra e argamassa parcialmente escavada na encosta de um morro. Não era uma residência qualquer, pois o templo, chamado de Igreja da Nutrição, uma vez que seria o local onde Jesus foi criado, passou a ser ponto de peregrinação até ser destruído pelo fogo, no século XIII. Quando freiras francesas se instalaram ali, no século XIX, as ruínas estavam praticamente intocadas havia séculos. Em 1914, os padre franciscanos construíram uma igreja sobre a estrutura que teria sido a oficina de José e batizada com o nome dele, mas a maior parte do sítio arqueológico ficou esquecida.
O assunto voltou à tona em 2006, com as escavações do professor Ken Dark, doutor em Arqueologia e História pela Universidade de Cambridge. Buscando encontrar evidências da igreja bizantina perdida, ele começou a estudar o local. O que o arqueólogo defende é que as ruínas no subsolo são do século I. Usada como cava e cripta pelos bizantinos, a habitação foi mantida razoavelmente preservada ao longo do tempo, o que leva a crer que tinha significado para os primeiros cristãos. Ela foi solidamente construída por alguém que dominava o ofício. Teria sido José? Dark admite que não tem prova irrefutável e sim um conjunto de evidências que poderiam sustentar a teoria. José era um artesão hábil, definido no Novo Testamento, em grego, como um “tekton”, artífice que tanto poderia ser um carpinteiro como um pedreiro.
Lembretes
Fechando este texto e aproveitando o momento, ficam aqui os nossos votos de um feliz Natal e um ano novo cheio de grandes conquistas para você e todas as nossas pessoas queridas!
O jornal TRIBUNA também publicou este artigo na sua edição do dia 24/12/2022.
Foto: Subterrâneo que seria o local de nascimento e moradia de Jesus ainda criança, em Nazaré. O arqueólogo Ken Dark escavou este local a partir de 2006. Pode vir daí a remotíssima tradição do nascimento de Jesus dentro de uma gruta.
Leia também Afinal, que Natal é esse?
Se você quiser me conhecer melhor, clique em https://www.professorlages.com.br/perfil