Já falamos aqui nesta coluna das candidaturas coletivas ou compartilhadas. Elas têm motivações idealistas, mas também práticas. Uma das idealistas é fazer um mandato mais transparente e participativo, de aumento da representatividade, já que essas candidaturas surgem na esteira da crise de representatividade da política que temos. A democracia participativa está no seu horizonte. Uma das motivações práticas é a possibilidade de ampliar a conquista de votos, ampliando muito a chance de fazer uma boa votação. Então, sem dúvida, têm um pragmatismo eleitoral legítimo também.
Um pouco de história…
O sucesso deste modelo de candidatura em pleitos anteriores também serviu de incentivo para ampliar a sua ocorrência agora. Exemplo foi a vitória da candidatura coletiva liderada por Monica Seixas (Bancada Ativista), eleita deputada estadual em São Paulo em 2018 pelo PSOL. Foi uma candidatura coletiva que conquistou 149.844 votos. Segundo os especialistas, esse desempenho e o de outras candidaturas vitoriosas acaba levando os partidos a adotarem esse modelo inovador de representação parlamentar, mas também como forma de tentar repetir o sucesso eleitoral.
Os mandatos coletivos ou compartilhados não são previstos na lei e envolvem um acordo informal entre quem se candidata e um grupo de pessoas que vão ajudar a definir os votos em plenário e os posicionamentos políticos de forma compartilhada. Essas candidaturas são aquelas formadas por um grupo de pessoas, em torno de 5 a 10, que já atuam juntas e seguem a mesma linha política. Em outros países, encontramos até dezenas ou até mais de mil pessoas, em que há uma diversidade ideológica e um sistema de consulta e discussão digital sobre as decisões do mandato.
Esse modelo não é novo, existe em vários países do ocidente e no Brasil desde as eleições de 1994, segundo a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS). As candidaturas, no entanto, começaram a crescer em 2012 e, atualmente, existem 22 mandatos em andamento. O estudo “Mandatos coletivos e compartilhados – Desafios e possibilidades para a representação legislativa no século XXI” define esse tipo de mandato como “uma forma de exercício de mandato legislativo em que o representante eleito se compromete a dividir o poder com um grupo de cidadãos“.
Funcionamento varia e depende de articulação, comprometimento e bom senso
Enquanto no mandato tradicional, o legislador tem a liberdade de exercê-lo de acordo com seus interesses, consciência e dentro dos parâmetros partidários, nos mandatos coletivos e compartilhados, o legislador realmente trabalha e decide em conjunto com outras pessoas, com um nível de partilha do poder de decisão que varia de acordo com cada arranjo, desde a formação de conselho de um consultivo até os chamados co-mandatários. Além disso, este tipo de proposta busca levar para a arena de decisões os interesses dos diversos segmentos e grupos representados por cada integrante do arranjo.
Como não há um reconhecimento oficial desses mandatos, não há como forçar o ocupante oficial do cargo a seguir as decisões tomadas pelo grupo. Por isso, o cientista político Leonardo Secchi afirma que há vários casos de candidaturas que acabam não dando certo e não seguem o modelo como esperado. Secchi ressalta que pode existir uma tensão entre a direção dos partidos e as candidaturas coletivas e compartilhadas. Isso, porque esses grupos podem tomar decisões que vão contra a orientação partidária, como em uma votação, por exemplo.
A lei prevê mecanismos para que o partido pressione seus parlamentares a seguirem suas orientações. Caso não mantenham a fidelidade em votações, por exemplo, podem sofrer punições e até ser expulsos. Secchi afirma que “se não houver um pré-entendimento, do ponto de vista de uma carta de independência, do ponto de vista de uma tolerância de que as decisões vão ser tomadas pelo grupo e o partido não vai ter a mão pesada, não funciona”. Estreiam na Câmara de Ribeirão Preto, a parti de 1º de janeiro, dois mandatos coletivos, um pelo PT e outro pelo PSOL. Vamos acompanhá-los, desejando-lhes sucesso e trabalho inovador e profícuo!
(Artigo também publicado em 05/12/20 no jornal Tribuna de Ribeirão Preto, SP)
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