Comemoramos este ano o centenário da Orquestra Sinfônica de Ribeirão Preto (OSRP). Comemorar é, antes de tudo, trazer à lembrança. A princípio, quero contribuir hoje com algumas pinceladas históricas sobre este nosso grande patrimônio cultural e artístico. Em outubro, teremos uma programação toda especial para reverenciarmos essa data. E já adianto que um dos pontos altos será o lançamento da obra de Gisele Haddad intitulada “O Centenário da Orquestra Sinfônica de Ribeirão Preto”, fruto de uma apurada pesquisa no Arquivo da Orquestra, no Arquivo Municipal e Histórico e em outros arquivos públicos e particulares.
Um esclarecimento oportuno
Aspecto surpreendente da obra é o esclarecimento da data da fundação da OSRP. Seja como for, se comemoramos o centenário em 2022, ela não teria sido fundada em 1938, como até aqui se acreditou. E, nesse aspecto, Gisele mostra toda a sua capacidade como pesquisadora e historiadora. Municiada de documentos, fotos e outras fontes fidedignas, ela demonstra, em definitivo, a existência da nossa Orquestra entre 1921 e 1923. Foi formada neste período a Sociedade de Concertos Symphonicos, por iniciativa do maestro Carlos Nardelli e de Homero de Sá Barreto, com um concerto inaugural em 31 de outubro de 1922 no Theatro Carlos Gomes.
A história, como ciência, nunca será um dogma, mas estará sempre aberta a novas descobertas alicerçadas no rigor da pesquisa. Em boa hora, a comemoração do centenário da OSRP em 2022 é uma correção histórica necessária! As denominações das suas entidades mantenedoras foram se alterando com o tempo, mas a Orquestra permaneceu única, perpassando todas elas através das atividades dos seus músicos. Primeiro, a Sociedade de Concertos Symphonicos em 1922, seguida pela Sociedade de Cultura Artística. Depois, em 1938, a Sociedade Musical de Ribeirão Preto, que se transformou na em 1970 na Sociedade Lítero-Musical de Ribeirão Preto, e atualmente, na Associação Musical de Ribeirão Preto.
Pioneirismo até na produção musical
Ribeirão foi pioneira em várias frentes. Da mesma forma, foi também na produção musical. Este pioneirismo foi marcante no início do século XX, acompanhando a pujança da cultura cafeeira. Assim também, as elites da época queriam mostrar o seu poder econômico lastreado no café. E assim faziam agindo como mecenas na Petit Paris, apelido reservado à nossa cidade por uma história oficial. Por outro lado, queriam se apresentar como uma classe urbana, moderna e culta. Espelharam-se nos modelos europeus, projetando por aqui uma belle époque caipira, no interessante conceito construído pelo saudoso professor da Unesp, José Evaldo Doin. Igualmente a OSRP foi uma das pioneiras do país.
Além disso, foi essencial o papel dos meios de comunicação na divulgação dos programas dos concertos e de outras atividades dos grupos musicais, em especial da nossa Orquestra. Os jornais da época, com destaque para o jornal A Cidade, a Folha da Manhã e o A Tarde, funcionaram como um depositário fiel dos acontecimentos envolvendo a OSRP, sendo uma fonte preciosa para a pesquisa. O pioneirismo de Ribeirão se manifesta também na radiodifusão. Com a PRA-7, fundada em 1924, a primeira emissora de rádio do interior do país, ocorreram transformações significativas nos costumes e repertórios musicais por aqui. Isso contribuiu enormemente para a popularização da produção musical em Ribeirão. Assim o Quinteto Max Bartsch já se apresentava na emissora em 1929!
Em defesa do nosso patrimônio cultural
De Carlos Nardelli a Reginaldo Nascimento, a nossa Orquestra viveu e sobreviveu, formando o nosso gosto musical popular e erudito. Gerações inteiras foram forjadas pela batuta de seus concertos que despertaram emoção e entretenimento. Cabe a nós, hoje, seguir com a missão de defendê-la neste momento crítico de desvalorização oficial da cultura, das artes e da ciência. Ela permanece como instrumento necessário para formação das novas gerações. E formação naquela dimensão que é vital para as boas relações humanas e sociais, ou seja, a cultura de um povo! Em suma, como patrimônio cultural da nossa cidade, o centenário da nossa Orquestra merece ser comemorado, e bem comemorado por todos os seus cidadãos e cidadãs!
Este artigo foi publicado também pelo jornal TRIBUNA na sua edição do dia 13 de agosto de 2022,
Assista também Gisele Haddad | O Centenário de nossa Orquestra Sinfônica e Entrevista com maestro Reginaldo Nascimento (participação da banda Kilotones)
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