Vimos há alguns dias a reforma administrativa encaminhada pelo prefeito para a Câmara. Ele buscava cumprir uma determinação do Tribunal de Justiça, mas, meio passando a boiada, foi muito além. Empreendeu uma ampla reformulação da administração municipal. A cereja do bolo era mesmo o DAERP, mas, aí, ele tropeçou com a liminar que a Justiça concedeu à vereadora Duda Hidalgo (PT), que barrou a extinção da autarquia. Liminar, depois, mantida pela Justiça. Mas o que mais chamou a atenção neste projeto foi o prefeito prosseguir com o modelito de sempre, ou seja, nada de participação social em assuntos que dizem respeito diretamente aos interesses dos munícipes e de toda a população.
Para bom entendedor, meia palavra basta
Outro aspecto da reforma foi em relação ao Arquivo Municipal e Histórico de Ribeirão Preto. Trata-se de uma seção da Divisão de Patrimônio Cultural e que sempre esteve subordinada à pasta da Cultura, desde a sua criação, em 1992. Foi criado pelo então prefeito Gasparini e seu secretário da Cultura Divo Marino. No projeto do prefeito, nada se dizia sobre o Arquivo e, mais uma vez, meio passando a boiada, criava-se uma Divisão de Arquivos na Secretaria da Administração. Afinal, como “para bom entendedor, meia palavra basta”, ficava claro que o Arquivo Histórico sairia da pasta da Cultura e Turismo e iria para a da Administração. Aliás, não foi a primeira vez que este assunto veio à tona.
Pesquisadores, historiadores, arquitetos e todos os interessados se mobilizaram rapidamente em defesa do Arquivo Histórico como um bem cultural de grande relevância. Ele não é um arquivo qualquer. Não são papéis velhos para entrarem em uma caixa de arquivo morto. Acima de tudo, trata-se de um acervo vivo, riquíssimo, já tombado pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (CONPPAC). Possui documentos da administração e de particulares desde 1860. São mais de 15 mil fotografias, coleções de nossos jornais do início do século XX, processos trabalhistas, dentre outros. Sua função social e cultural difere de todos os demais arquivos. Em suma, ali está a memória da nossa cidade. Portanto, precisamos preservá-lo e cuidar bem dele. O lugar do Arquivo Histórico é na Cultura!
MP e Justiça já receberam denúncias
Nem o prefeito, nem a secretária da Cultura, nem o chefe do Arquivo procurou ninguém para discutir este assunto. O Conselho da Cultura e o CONPPAC sequer estavam sabendo deste projeto. Há um histórico de menosprezo do Arquivo pelos mandatários de plantão. Mas não é verdade que a sua transferência para a Secretaria da Administração garantirá mais recursos para melhor estruturá-lo. Está garantida a contratação de historiadores e arquivistas que ele não possui? Em período relativamente recente, quando eu era conselheiro do CONPPAC, entrei com denúncia junto ao Ministério Público, tal o abandono em que o Arquivo se encontrava na antiga sede no Jardim Paulista. Até hoje, ainda está aberta uma Ação Judicial por conta disso.
Em síntese, a pasta da Cultura, por meio da Divisão de Patrimônio Cultural, sempre se apresentou como o setor com mais competência e afinidade para lidar com este Arquivo. Em que pese a necessidade de melhoria das condições de guarda deste acervo, projetos de digitalização e gestão de fluxo de documentos, dentre outros, são importantíssimos e a Secretaria da Cultura e Turismo sempre pode iniciá-los com o apoio das demais Secretarias para executar essas ações. De qualquer forma, o lugar do Arquivo Histórico é na Cultura!
Ainda vem muita luta pela frente!
Se escrevo tudo isso, é porque já muito utilizei do Arquivo nas minhas pesquisas sobre História de Ribeirão Preto. Sei como ele é importante e necessário para a nossa cidade. Desde a minha pesquisa do mestrado na UNESP, da qual resultou a obra “Ribeirão Preto: da Figueira à Barra do Retiro” sobre as nossas origens mais remotas, desenvolvi uma verdadeira relação simbiótica com esta instituição. Sem falar no livro “A saga de Manoel Fernandes do Nascimento”, todo ele fruto de pesquisa dentro do Arquivo. Também o “Ribeirão Preto Revisitada”, lançado mais recentemente.
Como não prevaleceu o bom senso e a racionalidade, o prefeito Nogueira vetou as emendas 124 e 125 aprovadas pela Câmara para que o nosso Arquivo Municipal e Histórico permanecesse na pasta da Cultura e Turismo. A Câmara ainda vai apreciar estes vetos mas, de qualquer forma, ainda vem muita luta pela frente!
O jornal TRIBUNA publicou originalmente este artigo no sábado, dia 01/05/2021
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