Assistimos a mais um massacre, no último sábado (14/5), no país que se diz o mais democrático do mundo. Um homem branco, fortemente armado, matou dez pessoas em um supermercado na região de Buffalo, estado de Nova Iorque. Ali, onde os moradores são predominantemente negros. Ele escreveu uma longa mensagem, publicada em suas redes, afirmando que os fregueses do supermercado eram de uma cultura que buscava “substituir etnicamente meu próprio povo”. A princípio, esta é a mesma matriz ideológica daquilo que ceifou a vida de milhões de pessoas na Europa e que chamamos de nazismo. O neonazismo continua sendo uma ameaça a todo o mundo.
Motor de terror racista
Antes de mais nada, não foi a primeira vez que um ataque terrorista, com essas mesmas matizes, ocorreu nos Estados Unidos. Em uma sinagoga de Pittsburgh, em 2018, também um homem branco, com um histórico de postagens antissemitas na internet, matou barbaramente 11 fiéis da comunidade, culpando os judeus por permitirem a entrada de “invasores” imigrantes nos Estados Unidos. Do mesmo modo, no ano seguinte, outro homem branco, irritado com o que chamou de “invasão hispânica do Texas”, abriu fogo contra clientes em uma loja do Walmart em El Paso, deixando 23 mortos. Ele disse à polícia que havia tentado matar mexicanos.
Primeiramente, três ataques ligados por uma crença comum em constante mutação, agora conhecida como “teoria da substituição”. Esta é a noção de que as elites do ocidente querem “substituir” e enfraquecer os americanos brancos. Então, nos extremos da vida americana, a teoria da substituição tornou-se um motor de terror racista, ajudando a inspirar uma onda de ataques em massa nos últimos anos. Foi o que alimentou o comício de direita de 2017 em Charlottesville, na Virgínia, que explodiu em extrema violência. O neonazismo continua sendo uma ameaça a todo o mundo.
Popularidade crescente nos EUA
Um dos artífices dessa teoria é o escritor francês Renaud Camus. Primeiramente considerado um artista de vanguarda e um ícone do movimento gay, tornou-se uma referência ideológica de um dos setores mais radicais da direita global. Seu pensamento está por trás do discursos dos responsáveis pelos últimos ataques racistas, inclusive em Buffalo. Esse vínculo nasceu com seu livro Le Grand Remplacement (A grande substituição). Sobretudo ele expõe a teoria de que a Europa branca e cristã está sendo destruída por hordas de imigrantes negros e de tez escura do norte da África e da África subsariana.
Nesse sentido, sua teoria foi acolhida por grupos supremacistas dos Estados Unidos. Dessa forma, palavras de ordem como “não nos substituirão” eram gritadas pelos manifestantes de Charlottesville. A teoria da substituição, antes confinada em grupos subterrâneos, torna-se cada vez mais popular nos Estados Unidos. Ela se tornou uma força potente na mídia e na política conservadoras, onde foi remodelada para atrair grandes audiências e retuítes. Enfim, essas ideias se tornaram comuns no Partido Republicano, ditas em voz alta no Congresso, e abraçadas por uma crescente variedade de candidatos de direita e lideranças reacionárias, como Donald Trump.
Grupos supremacistas também no Brasil
Nenhuma figura pública promoveu a teoria da substituição de forma mais implacável do que o apresentador da Fox News, Tucker Carlson, que fez da mudança demográfica um tema central de seu programa, desde que ingressou no horário nobre, em 2016. Uma investigação do New York Times, publicada este mês, mostrou que, em mais de 400 episódios de seu programa, Carlson ampliou a noção de que políticos democratas e outros grupos de elite querem forçar mudanças demográficas por meio da imigração. Em suma, éÉ assustador como essas ideias têm conquistado corações e mentes da população.
Recomendo a leitura de um artigo publicado pelo professor Leonardo Sacramento em suas redes sociais (https://www.facebook.com/leonardo.sacramento.777701). Ele inicia assim o seu texto: “o principal grupo terrorista do planeta, hoje, é o supremacismo branco. Precisamos falar abertamente que, se existe uma Guerra contra o Terror, essa guerra é contra o supremacismo branco e ocidental.” Trata-se de um texto forte que aprofunda a discussão do supremacismo branco, que já lança raízes também entre nós aqui no Brasil, escudado pela ascensão do governo de extrema direita. Kyrie eleison!
Este artigo foi publicado originalmente no jornal TRIBUNA na sua edição doa dia 21 de maio de 2022
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